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Megafone do esporte: a força do voleibol

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Arte: Zuca Sardan


“Deixa Falar: o megafone do esporte”, espaço de debates que sai quinzenalmente, sábado sim, sábado não, aqui, no Literatura na Arquibancada, na Carta Maior (http://www.cartamaior.com.br), no blog do Juca (http://blogdojuca.uol.com.br/) e no Centro Esportivo Virtual (CEV) (http://cev.org.br/), debatendo o esporte em geral e o futebol em particular, dialogando com a História, Política, Música, Economia, Literatura, Cinema, Humor, traz nesta edição artigo sobre o voleibol brasileiro escrito pelo mestre em Educação Física e Sociologia, Wanderley Marchi Júnior.

"Na 'Pátria de Chuteiras' o esporte jogado com as mãos"
Por Wanderley Marchi Júnior


Quando Nelson Rodrigues chamou o Brasil como a ‘Pátria de Chuteiras’, muito provavelmente ele não imaginava quais os contornos esportivos que o país viveria ao longo das décadas futuras. Obviamente o cenário e os contextos social, histórico e político vividos naquele momento subsidiavam e legitimavam a observação e a alcunha elaborada pelo jornalista e dramaturgo.

Interessante também destacar que junto da ‘Pátria de Chuteiras’ outros codinomes e sentimentos foram historicamente surgindo e, junto deles, determinada representatividade social ou até mesmo um conjunto de referências passíveis de serem observadas na construção de uma suposta ‘identidade nacional’. O orgulho nacionalista presente na Copa do Mundo de Futebol de 1970 ou o processo de estigmatização da Copa do Mundo de Futebol de 1950 podem atestar esse argumento, ainda sem tocar na polêmica ‘Síndrome de Vira-latas’.

Entretanto, não é sobre o futebol, tampouco sobre Nelson Rodrigues, que me proponho a escrever nesse momento. Gostaria de dividir com nosso leitor um cenário esportivo que surgiu num ambiente clubístico-elitista e passou a ser no Brasil sinônimo de organização e sucesso, um modelo, uma referência ou, parafraseando o senso comum, uma ‘paixão nacional’. Falo do voleibol.


Originariamente criado por William George Morgan, na cidade de Holyoke, em Massachussets/EUA, no ano de 1895, o esporte denominou-se “Minonette” e procurava atender uma demanda de senhores oriundos da emergente burguesia que buscava na Associação Cristã de Moços/ACM uma prática esportiva que não tivesse o contato físico do basquetebol e que também fosse praticado em locais fechados resguardando seus praticantes da exposição às baixas temperaturas do inverno norteamericano.

Morgan, então diretor da ACM, acompanhou e subsidiou a trajetória de desenvolvimento e expansão do “Minonette” até chegar à condição de “Voleibol”, principalmente pensado nos objetivos do esporte que eram lançar a bola e atingir a quadra adversária através de golpes como o “voleio”. Essa trajetória foi marcada historicamente de várias formas, desde a obrigatoriedade da prática nas escolas norteamericanas até sua divulgação internacional pelas tropas militares no período da 1ª Guerra Mundial.


Há indícios históricos que o esporte chega ao Brasil em 1915, no Colégio Marista de Recife/PE, embora fontes oficiais indiquem que sua inserção ocorreu no ano de 1916 na ACM da cidade de São Paulo. Independente da precisão, ou dúvida, sobre esse dado, o que nos desperta interesse e atenção é a trajetória na qual a modalidade se desenvolveu no país, principalmente se considerarmos quase um século de duração desse processo.

Inicialmente sua aceitação e inserção não foram imediatas. Poucas instituições deram espaço a essa prática, sendo que um dos clubes pioneiros foi o Fluminense F. C., e, posteriormente, o Botafogo F.R., no Rio de Janeiro, o Clube Paulistano e o Santos F.C., em São Paulo. Também há registros sobre o Minas Tênis Clube, em Minas Gerais. Nos anos 60, tal como no futebol, o grande clássico do voleibol era disputado pelas equipes de Mané Garrincha (Botafogo) e de Pelé (Santos), incluindo nesse quadro a formação e a base da seleção brasileira.

Botafogo, campeão de 1946.

Aos poucos o esporte foi se inserindo no ambiente escolar, contudo, com certa reticência ou até mesmo resistência sobre sua prática no universo masculino. A “tradição” determinava aos meninos o futebol e às meninas o voleibol, fato este que durante muito tempo criou certos preconceitos. Cabe destacar que essas determinações ou associações foram gradativamente perdendo força ou, em última instância, relativizando-se na prática esportiva escolar.

No decorrer das últimas quatro décadas, as quais marcaram a superação do processo de amadorismo da modalidade e rumaram para o processo de profissionalização e de espetacularização, podemos destacar feitos históricos dos clubes empresas, tanto no masculino quanto no feminino, que imprimiram um potencial desenvolvimento do voleibol brasileiro. Não é difícil ao leitor com um pouco mais de idade recordar, por exemplo, dos memoráveis confrontos entre Pirelli/SP e Atlântica-Boa Vista/RJ que lotavam os Ginásios do Ibirapuera e do Maracanãzinho, ou até mesmo, da singular partida entre as seleções nacionais da antiga URSS e do Brasil, em 1983, no Estádio do Maracanã numa noite chuvosa e com um público de 95.887 expectadores pagantes.


Ainda nesse contexto, temos as primeiras grandes conquistas internacionais, tais como a medalha de prata no Mundial Masculino da Argentina, em 1982, e posteriormente, o segundo lugar nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, também no masculino. Desde então, vários outros resultados expressivos foram sendo computados para a modalidade no Brasil, culminando com o recém Bi-campeonato Olímpico Feminino nos Jogos Olímpicos de Londres, 2012.

Finalizando esse breve “sobrevoo” histórico do voleibol brasileiro, chegamos aos dias de hoje nos quais vemos uma modalidade esportiva organizada profissional e administrativamente, obviamente com seus problemas e restrições. Entretanto, os constantes resultados internacionais, as recentes finais da temporada 2012/13 da Superliga Masculina e Feminina com representantes do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, apenas para citar alguns fatos, no limite nos leva a indagar se Nelson Rodrigues ainda confirmaria sua observação ou se, particularmente como eu, repensaria se somos mesmo a ‘Pátria de Chuteiras’ ou se nos dá mais orgulho e esperança sermos ou virmos a ser a ‘A Pátria de Joelheiras’... Fica pra pensar...

Sobre o autor:

Wanderley Marchi Júnior: foi atleta de voleibol durante 18 anos, é doutor em Educação Física pela Unicamp, pós-doutor em Sociologia do Esporte pela West Virginia University/USA, docente dos programas de pós-graduação em Sociologia e de Educação Física da Universidade Federal do Paraná/UFPR e vice-presidente da Asociación Latinoamericana de Estudios Socioculturales del Deporte/ALESDE e, para os ‘aficionados’ pelo futebol, torcedor do Velo Club Rioclarense!




Dois Toques do Megafone:

1)      Para um maior aprofundamento histórico dos dados e fontes consultadas, além da análise sociológica feita sobre essa trajetória do voleibol brasileiro, consultar MARCHI JR., Wanderley. “Sacando” o Voleibol. São Paulo: Hucitec, Ijuí: Unijuí, 2004.
2)      Aproveitando o chamamento ao debate por Wanderley Marchi Jr. , o editor do Megafone considera difícil ou praticamente impossível o Brasil vir a adotar o vôlei como seu esporte de paixão nacional. Os motivos são vários que certamente serão abordados em artigos posteriores.

A grande popularidade do vôlei no Brasil, talvez o segundo ou terceiro esporte nacional, torna esta polêmica ainda mais interessante. Na esteira do artigo publicado lembramos da última frase  do poema de João Cabral de Melo Neto, “O Futebol Brasileiro Evocado da Europa”: “dando aos pés astúcias de mão.”

O próprio professor Wanderley tem dúvidas sobre se o vôlei é o esporte mais popular em algum país do mundo. Diz ele: “Talvez só na Polônia.”
Será que o vôlei algum dia terá o mesmo fascínio e mistério do futebol?  Deixa falar....

Deixa Falar: o megafone do esporte, criação e edição de Raul Milliet Filho.

Sobre os autores do “Deixa Falar: o megafone do esporte”


Ademir Gebara Graduado em História e Educação Física, mestre em História pela USP, PH D em História pela London School of Economics and Political Science., ex-diretor e coordenador de Pós da FEF Unicamp, professor visitante da Universidade Federal da Grande Dourados.




Antonio Edmilson Rodrigues – é América, livre docente em História, professor da UERJ e da PUC-RJ, pesquisador de História do Rio de Janeiro, escritor de temas vinculados à história urbana, coordenador do projeto Conversa de Botequim e autor de João do Rio, a cidade e o poeta.




Bernardo Buarque – professor da Escola Superior de Ciências Sociais (FGV) e pesquisador do CPDOC/FGV. `É editor da coleção Visão de Campo (7 Letras). Em 2012, publicou o livro ABC de José Lins do Rego (Editora José Olympio).



Flavio Carneiro - é botafoguense, além de escritor, roteirista e professor de literatura na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).www.flaviocarneiro.com.br.


José Paulo Pessoa – é botafoguense, ator, advogado, que achava o Didi mais impressionante que o Garrincha (que foi o maior que já vi!). Diretor, cantor e compositor do Bloco das Carmelitas, de Santa Teresa (RJ).



José Sebastião Witter – é torcedor do São Paulo, professor emérito da USP e professor normalista.


Luiz Carlos Ribeiroé professor do Departamento de História da UFPR e coordenador do Núcleo de Estudos Futebol e Sociedade.


Marcelo W. Proni – economista, doutor em Educação Física pela Unicamp, professor do Instituto de Economia da Unicamp, torcedor do Botafogo de Ribeirão Preto.


Marcos Alvito - É carioca de Botafogo e Flamengo até morrer.  É um antropólogo que dá aula de História na UFF desde o longínquo ano de 1984.  Perna-de-pau consagrado, estuda um jogo que nunca conseguiu jogar direito: o futebol. Mas encara qualquer um no futebol de botão. Acaba de publicar A Rainha de Chuteiras: um ano de futebol na Inglaterra (www.clubedeautores.com.br)



Ney Costa Santos- É Flamengo, Mestre em Comunicação Social e Professor da PUC-Rio. Cineasta, dirigiu os filmes Heleno e Garrincha, Meu Glorioso São Cristovão, O Pulo do Gato, Cinema Interior, Cole in Rio e Padre-Mestre.


Raul Milliet Filho – é botafoguense, mestre em História Política pela UERJ, doutor em História Social pela USP. Como professor, pesquisador e autor prioriza a cultura popular. Gestor de políticas sociais, idealizou e coordenou o Recriança, projeto de democratização esportiva para crianças e jovens. 



Ricardo Oliveira – é Vasco, jornalista, educador da prefeitura do Rio de Janeiro e pesquisador da História do futebol. Coordenador da pesquisa do livro Vida que Segue: João Saldanha e as Copas de 1966 e 1970.


Zuca Sardan (Carlos Felipe Saldanha) – É torcedor do Vasco, nasceu no Rio de Janeiro em 1933, mas vive em Hamburgo, na Alemanha. Estudou arquitetura, mas fez diplomacia. Estudou desenho, mas fez letras. Hoje dedica-se a desenhos, vinhetas, poesias e folhetins. Entre seus livros, estão: Ás de coletepoesias, desenhos e Osso do Coração.

Acompanhe as outras edições do Deixa Falar: o megafone do esporte nos links abaixo:

Arte: Zuca Sardan

http://www.literaturanaarquibancada.com/2012/12/deixa-falar-o-megafone-do-esporte.html 


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